Da baixeza
Maciel, trinta anos, anão, vivia uma vida de pequenas expectativas. Não poderia ser diferente. Sua vida profissional não podia ser grande coisa - ou haveria de abrir mão de sua dignidade e aceitar os trabalhos que geralmente são oferecidos a pessoas como ele (empregos em programas televisivos de quinta categoria ou qualquer coisa no ramo da exploração de minas de carvão mineral, na maior parte das vezes) ou morreria de i
nanoção, digo inanição. Optou pela primeira alternativa. Era operador de telemarketing. O baixo salário infundava seu esforço e não permitia sequer o mais ínfimo dos luxos.
Sua vida amorosa tinha sido, até agora, bastante curta. Arrumara certa vez uma namorada, que conhecera num dia de inverno em que resolvera ir ao circo. É verdade que Maciel, durante o parco tempo de relacionamento, nunca tivera oportunidade de apreciar o semblante de sua amada. É que, segundo ela mesma dizia, era descendente de portugueses. Uma semana depois do primeiro encontro, o circo encerrou aquela temporada e dirigu-se a outra cidade. A namorada de Maciel, parte importante do espetáculo, precisou partir. Fato é que não teria dado certo, de uma forma ou de outra. A distância entre os dois sempre fora um empecilho.
Com o coração feito em pedaços, o estado de espírito de Maciel chegou a níveis abaixo dos tidos como saudáveis. Não comia, atendia aos clientes da empresa com pouca vontade e nos momentos de folga privava-se até mesmo de pequenices.
Um dia, Maciel, que comia alguma coisa preparada no microondas, jogado no sofá, sintonizou, por acaso, um programa motivacional. O homem do programa discorria sobre o sentido da vida, desilusões e comida enlatada. Dizia que era preciso ter paciência perante as dificuldades e que, mais cedo ou mais tarde, a estrela de todos nós haveria de brilhar. Maciel sorvia cada palavra. Sentindo-se um pouco melhor, começou a retomar o ritmo de sua vida.
Algumas semanas depois, recebeu com grande alegria a notícia - um tanto desencontrada, é verdade - de que Plutão era uma estrela anã, ou qualquer coisa nesse sentido. Parecia que finalmente os astros sorriam para ele.
Tomado de excessiva motivação, Maciel decidiu que era tempo de ser feliz. Encontraria um novo amor.
Maciel, que sempre tivera certo fetiche por gordinhas, decidiu-se por tentar a sorte com uma colega de trabalho por quem sempre se interessara, mas a quem, por medo da rejeição, nunca havia dirigido a palavra. Mas agora não havia o que temer. Plutão estava ao seu lado.
Foi rejeitado.
Tudo bem, havia outra mulheres no mundo. Resolveu tentar a sorte com outra rechonchuda colega, que sempre o comprimentava, digo, cumprimentava, e com quem tinha mais intimidade. Mais um insucesso.
Após o expediente, resolveu ir à caça. Visitou um spa. Foi expulso a chutes após assediar três senhoras de respeito.
No dia seguinte, Maciel foi convocado para falar com seu chefe. Segundo havia sido informado, Maciel tornara-se verdadeiro transtorno às mulheres e um entrave ao trabalho e, por isso, precisaria ser demitido.
Completamente desacreditado, Maciel voltou para casa. No noticiário, debatiam a natureza de Plutão.
Maciel dirigiu-se ao banheiro e, em hora pequena, enforcou-se numa Gorducha.
11:39 PM.
Da obturação bloguística
Não há arma mais eficiente contra a simpatia das pessoas do que um celular.
Está de bobeira na sala de aula, esperando o professor que sempre atrasa, e não quer ter que conversar com o engraçado rapaz que se senta ao seu lado? Sem problemas. Abra o celular. Finja estar vendo algo interessante. Junte as sobrancelhas em sinal de preocupação enquanto passeia por sua agenda telefônica procurando algum número para não ligar.
Precisou ir ao banheiro, no escritório, e, agora, não quer travar contato com os eventuais colegas que encontrar no caminho de volta? Digite telefones imaginários e espere por alguém que nunca atenderá.
Mesmo se, por qualquer motivo, você se descuidar e for alvejado por alguém, tenha em mente que o celular ainda lhe poderá ser útil. A tática da ligação inesperada surte melhores efeitos quando utilizada em conversas de mais de duas pessoas, quadro em que se torna mais fácil uma rápida retirada para atender à falsa ligação, mas se você tiver nervos de aço e der pouca importância aos sentimentos alheios, também será de aplicação satisfatória com apenas um interlocutor.
As táticas são muitas e, se bem manejado, o celular poderá preservá-lo de horas de conversa amigável e descontraída e sempre passará aos outos a impressão de ser você uma pessoa socialmente ativa e ocupada demais com sua miríade de amigos para dar atenção às aflições de reles colegas. Recomenda-se, também, a adquirição de aparelhos com suporte a jogos como Reversi e Campo Minado, que se provam muito úteis durante eventos longos e de presença indispensável, como casamentos (e, aqui, inclui-se também o seu próprio, desde que se tenha a discrição de configurar o aparelho para o modo vibratório) e batizados.
11:56 AM.